"Também vós leigos podeis viver a espiritualidade das Filhas de Sant'Ana; ser os cem braços e chegar lá onde as Filhas não podem chegar" Intuição de Rita de Maggio - 09 de dezembro de 1981


terça-feira, 15 de abril de 2014

Páscoa 2014 - mensagem de Dom Sérgio

PÁSCOA  2014                            1
ABRAÃO VIU O MEU DIA ... (Jo 8,56)
            O que viu Abraão, ou melhor, o que pode ter visto, suficiente para exultar e alegrar-se?
            Abraão experimenta e pode conhecer os “dias do homem”, os seus dias inconsistentes, já transcorridos:” Os anos de minha peregrinação foram breves e infelizes.”. (Gn 47, 9).
            Os homens constroem sua história com os dias que “brotam de manhã e à tarde já murcham” (Sl 90). Na verdade... “era noite e era manhã” (Gn 1, 5), isto marca a brevidade do dia do homem, uma sombra que passa...
            Ao invés, o “dia de Deus” é como “mil anos”: um tempo infinito, uma medida transbordante de vida: incontáveis os seus limites.
            Assim o salmo 118, iluminado pela liturgia pascal, exalta o dia de Deus: celebra uma misericórdia que não tem fim, que liberta da angústia, dos temores; que convida a refugiar-se em Deus, adorando sua vitória admirável sobre povos inteiros! Sobre os inimigos que avançavam em desespero! E finalmente provoca gritos de alegria, de espanto e admiração; cantos de alegria e ação de graças. Tudo feito por Deus no “seu dia”!
            Também “os dias da criação” são do Senhor, bem como a sua explosão de vida, porém os seis primeiros foram sujeitos ao desgaste do tempo. Na verdade, esgotados em “fadiga e trabalho” (Ex 20, 9-10). É a história do universo, dos homens que se encaminham na dor para o drama de sua perdição!
            Ao invés, o sétimo dia é o “dia do Senhor”. Para honrá-lo o homem não fará nenhum trabalho. Porque Deus, no sétimo dia “descansou depois de toda a obra que fizera”. (Gn 2, 2-3)
            Por conseguinte o sétimo é um dia particular, de posse exclusiva de Deus, por Ele abençoado! É o dia em que Deus repousa!
            Mas realmente Deus pode descansar, se “todos esperam de ti que a seu tempo lhes dês o alimento”? (Sl 104, 27). E como é possível que Deus cesse qualquer atividade “suas mãos a saciar as necessidades de todos os viventes” (Sl 145, 15), de modo a ser ainda “atento aos gritos dos filhos dos corvos”? (Sl 147, 9).
            Também o profeta protesta: “lembrar o Senhor que fez as promessas; não se cansar nem se dar repouso e nem a Ele dai repouso!” (Is 62, 6-7 e Sl 83, 2).   Com firmeza Jesus declarará aos judeus: “O meu Pai trabalha sempre! (Jo 5, 17).                                                                                                          
Por outro lado: “Do Senhor é a terra e tudo o que contém” (Sl 24) e ainda “que os céus continuem a narrar a glória de Deus” (Sl 19, 1), esta não cessa de “chamar as estrelas pelo nome" (Is 40, 26). Diferente o repouso!
                        Porém existe um “desgosto” de Deus: violar seu descanso... ignorando-o! Portanto aqueles que não conhecem os seus caminhos, não podem entrar (Sl 95). Os homens temeram aquele repouso no dia do juízo.  Então procuraram esconder-se da ira divina (Ap 6, 15-17).  Torna-se assim tão familiar, no “sétimo dia”, revelar-se o “sétimo sigilo”! (Ap 8, 1-5).     
                        A sua abertura provoca um silêncio prolongado. Cada criatura é envolta. Um altar, depois incenso e perfumes e orações dos santos. Em suma uma liturgia de louvor; uma adoração incessante sobe de toda a criação; cada atividade termina. Espera-se o manifestar-se de uma Presença: sim, temor, ânsia por aquilo que deve acontecer... é então o “repouso de Deus” a invadir o universo; toda criatura se prostra; tudo se dissolve diante dele, SÓ DEUS REINA!...
                        Maria, sentada aos pés de Jesus, abandonou todo trabalho: há agora somente uma Presença que se expande, que enche a alma: ela é grata por poder silenciar para aquele que a chama ao repouso.   Marta continua a mover-se, ignora!  (Lc 10, 38-42).
                        O espírito do homem não pode esgotar-se apenas nos dias de fadiga e de trabalho. O repouso de Deus, o “sábado”, exprime a vocação para entrar no tempo e no espaço de Deus, para cruzar o limiar da eternidade.
                        No Egito Deus preparou a libertação, criando um espaço, um tempo... três dias de festa no deserto! (Ex 5, 1-5). O deserto floresce, a vida começa a espalhar-se!  
                        Por isso Deus quer que você construa sua morada no meio do povo, sob o modelo da habitação... contemplado no céu! (Ex 25, 8-9. 40). O céu, o infinito, irrompe sobre a terra, como postos avançados divinos, queridos e preciosos!
                        Assim Deus realiza toda a sua obra.
                        Eis que o dia de sábado recebeu o “autor da vida” (At 3, 15): Jesus é colocado no sepulcro! É sábado, repousa... Sobre seu corpo os sinais visíveis do ódio.  Sobre Ele “cavalgaram” os ferozes cavaleiros do Apocalipse, história dramática de nossa miséria: guerra, fome, morte e depois soberba cruel, inimaginável sofrimento dos justos, dos santos... (Ap 6).
                        A “Vida” se acende no abismo da “morte”... mas a Vida ainda trabalha... O sábado é agora preenchido com a plenitude divina.  Espera-se uma nova criação! No universo cada criatura treme. O “dia do Senhor” transborda de esperança: de novo “os teus mortos tornarão a viver e teus cadáveres ressurgirão, os que dormem no pó vão acordar e a terra das sombras dará à luz”. (Is 26, 19). O sábado termina.
                                                                                 
                        É GERADO O DIA DO RESSUSCITADO!                                                                                                Então aqui está Abraão; o que pode ter visto ou ouvido, para fazê-lo exultar de modo extraordinário? Na sua vida que estava no fim, estéril e solitária, o que aconteceu para deixá-lo sair de sua própria terra, sem saber por onde deveria andar, mesmo esperando “uma cidade construída por Deus”? (Hb 11, 8-10).
                        Desse modo Deus rompeu o silêncio, começava a manifestar-se: a Palavra eficaz convidava a decidir entrar no... repouso: “Vai para a terra que te mostrarei!” (Gn 12, 1) 
                        Abraão não reconheceu como sua a Palavra, no entanto parecia vir de um íntimo conhecido dele; e tantos dias e anos se passaram, não mais sentira a sua presença, onde se escondera? A vida, até então, não era para ter passado como Abraão pensava ou queria. Estava só, cansado, sem futuro.
                        De repente, o comando que não admite atraso, então o acolhimento generoso, livre; o impulso determinado que deixa Abraão maravilhado: “quem está dizendo com tanta autoridade para eu sair daqui, serei eu o teu futuro?” E Abraão se movimenta, causando espanto, dúvidas, preocupações: “Para onde vamos, se você já não precisa enfrentar caminhos conhecidos e batidos? Em qual desconhecido você quer nos forçar a viver? A partida repentina deve ter provocado angústia, sobretudo em Sara...
                        A Palavra começa a envolver o mundo do “eleito”; Abraão decidiu, de modo que o memorial que leva em si mesmo, intimamente o sustenta e o guia.
                        Abraão compreende que não tem medo: existe uma certeza, que a descendência prometida é garantida por alguém que tem o futuro de cada homem. Até mesmo uma viagem para o desconhecido lhe dá paz! O suficiente para surpreender a todos, quando saiu para seu jovem sobrinho Lot a escolha das pastagens, precisamente porque não há nenhuma disputa entre eles. (Gn 13, 8-9).
                        Esse homem velho, uma vez decepcionado, se ilumina de mansidão.
                        Mas que loucura entregar-se nas mãos de um jovem! A escolha de Lot se revelará imprudente, causará sofrimento e medo... Porém mais uma vez, o homem de paz sairá vitorioso sobre a injustiça e a violência (Gn 14, 13-16). A Palavra, também curará Abraão da ganância e da fome de posse: tem em si a segurança abundante e melhor. Agora nada vai tirar o que não é seu. (Gn 14, 22-24).
            Depois... momentos de escuridão! A descendência que aguarda lhe virá provavelmente de seu fiel servidor Eliezer? A Palavra tranqüiliza-o: “Não, virá de um nascido de ti”; em seguida:” Avista o céu, podes contar as estrelas?” (Gn 15, 1-5).                                                                                                                                     
                        Mais ainda, o dono da Aliança, não foi pensado nem desejado, no entanto está ali: a Palavra é empenhada em juramento! A fazer feliz um velho nômade...                                                E a Palavra que havia feito de Abraão um homem moderado, agora o treina com a peregrinação de um forasteiro no sentido de um indecifrável desconhecido, para se tornar um homem paciente. Na verdade o cansaço da espera provoca dúvidas: será possível um corpo tão frágil, ainda esperar?
                        Anos se passaram. Com o passar do tempo Sara torna-se ansiosa, pois não dava filhos à Abraão e lhe sugere: “Una-se a minha escrava para ver se ela me dá filhos”. E Abraão se entrega aos desejos da mulher! (Gn 16, 1-6). Mas o ciúme, o espírito de rivalidade irá surgir entre as duas mulheres, escrava e senhora. É difícil conservar a paz quando as paixões são desencadeadas por decisões precipitadas, imprudentes.
                        Abraão parece resignar-se com o fato de que Ismael possa se tornar o instrumento escolhido por Deus para aquela misteriosa descendência.
                        Porém a Palavra o incomoda: “Sara, tua mulher, dará a luz um filho!” (Gn 17, 15-19). Um brilho ilumina a noite: de um peito morto pode surgir a vida?  A Palavra, portanto, “dá vida aos mortos?” (Rm 4, 17).
                        Realmente realiza o que havia prometido!
                        Abraão sente uma grande alegria: “Sara lhe dará um filho!” Exulta como o jovem que acolhe a esposa em sua casa... Toda a sua vida lhe é restituída: não é mais sonho ou desejo da juventude, mas a emoção da paternidade... Aquele peito de repente floresceu! Para o sorriso de Deus...  Quantas incertezas, dúvidas e humilhações naqueles 25 anos transcorridos! Quanta resistência, sobretudo de Sara, em andar pela estrada muitas vezes desconhecida... Em suma, todos os tipos de perigo que colocam à dura prova a fé de Abraão (2 Cor 11). Nunca poderia imaginar o que hoje experimenta, um impossível: o seio de Sara , morto, é restituído à vida! Se esta revelação lhe fosse anunciada no tempo da partida, provavelmente não haveria saído. Agora fraco, a confiança na Palavra. Em que profundezas da alma, teria de encontrar a luz para acreditar desde então, em tal milagre? Agora tudo é luminoso, novo... sim, a Palavra pode fazer tudo isso!
                        Abraão se rende sobrecarregado pelo espanto e pelo imenso poder efetivo da Palavra, que abraça o infinito e “chama à existência coisas que não existem”. A Palavra, agora, não pode “esconder o ato de Deus: Abraão se tornará uma grande nação” (Gn 18, 17-33). E não somente: Abraão é acolhido na intimidade de Deus; torna-se um... amigo! Conversa com Deus em uma confiança sem limites! Sem temor: chega a conseguir a salvação para seu sobrinho Lot (Gn 19, 29); e até sugere o perdão para Sodoma!

                        Abraão e Sara desfrutam da presença divina: Isaac é o presente inesperado, inimaginável!... Porém sabemos pouco sobre esta família querida e abençoada por Deus. Certamente Abraão continuou a ser um homem de paz: concluiu uma aliança com Abimelec; homem de fé; invoca o nome do Deus da eternidade; continua a sua peregrinação no país dos Filisteus... “por muito tempo” (Gn 21, 27-34).
                        Muitos anos transcorridos, não podemos saber de outro caminho espiritual de Abraão, de Sara, mesmo de Isaac. Nem podemos avaliar o grau de unidade alcançado com Deus; mesmo o simples crescer nas virtudes. Também não temos conhecimento da intensidade da sua oração! Porque os “autores sacros” dificilmente satisfazem certa curiosidade...
                        No entanto podemos assistir a súbita e incompreensível solicitação de Deus!   Que sentido pode ter semelhante sacrifício? (Gn22). Nós não entendemos... O que sabe Abraão sobre aquele pedido? Ele não lamentou nem protestou; nem mesmo uma pequena resistência... nada. Um ato de obediência pronto, sereno... sublime! Uma admirável intimidade entre Abraão e seu filho. Juntos, sobem ao monte indicado por Deus. Isaac parece participar consciente do evento de onde sabe retornar!
 DE FATO, DEUS PROVIDENCIARÁ. É a Palavra que Abraão já conhece, que sempre o sustentou, o iluminou; que agora dá ao filho. É a Palavra que penetrou-o com o coração de Deus e no coração de Deus. Abraão viveu e viu os dias do Ressuscitado, seus inumeráveis “impossíveis” e bem como “esperar contra toda esperança”, que lhe anunciavam uma nova criação.
BOA PÁSCOA!!
Com paternal afeto     
    Don Sérgio